segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Resilienciambientealimento


https://veganismoblogueiro.wordpress.com/2011/03/23/dieta-vegana-e-sustentabilidade-glocal/
23/03/2011
Dieta Vegana e Sustentabilidade (G)local
Por Paula Brügger (Terra Verde Viva)
brugger@ccb.ufsc.br

Os problemas ambientais que enfrentamos hoje fazem parte de um contexto mais abrangente que envolve os valores e práticas que guiam nossa sociedade e nossa cultura. Entre os traços marcantes que se encontram no cerne de nossa relação com a natureza destacam-se uma racionalidade essencialmente instrumental; o antropocentrismo e o especismo [1]; e uma maior valorização do conhecimento de cunho pragmático, em detrimento de outras formas de saber. Esses e outros traços da chamada visão de mundo mecanicista – somados a uma apologia à produtividade – fazem com que a natureza seja vista unicamente como uma fonte de recursos, como uma parte produtiva do todo. Mas a natureza não é um subsistema da Economia e sim o contrário. É também preciso não tratar como sinônimos os termos crescimento e desenvolvimento no que tange aos processos econômicos. Herman Daly nos ensina que “crescer significa aumentar de tamanho por acréscimo ou assimilação de material. Crescimento, portanto, significa aumento quantitativo na escala das dimensões físicas da economia. Desenvolver implica em uma melhoria qualitativa na estrutura, design e composição dos estoques físicos de riqueza e bens, o que resulta de um maior conhecimento tanto da técnica quanto do seu propósito. Uma economia crescente está se tornando maior; uma economia em desenvolvimento está se tornando melhor”. Ele critica ainda o crescimento econômico como a única cura aceitável para a pobreza [2].
Produtividade x recursos finitos:
É nesse contexto que vem se proliferando uma variedade de processos produtivos que utilizam os recursos naturais num ritmo incompatível com sua taxa de renovação. Estritamente falando, todos os recursos naturais são renováveis, mas eles fazem parte de ciclos naturais que têm duração variada. Os chamados “recursos renováveis” são simplesmente aqueles que pertencem a ciclos cuja duração é relativamente curta, mas isso não significa que sejam inesgotáveis. Já os que se renovam em períodos de tempo geologicamente longos são classificados como não-renováveis, pois seus estoques são considerados “fixos”. Exemplos dos primeiros são a água e a biomassa, de forma geral [3], enquanto que petróleo, solos e jazidas minerais se constituem em exemplos dos últimos. É preciso destacar ainda que na maioria dos processos produtivos há uma permanente interdependência entre recursos renováveis e não-renováveis. Caso típico é o das monoculturas como a soja ou o milho. As colheitas são recursos renováveis, mas são freqüentemente mantidas às custas de recursos não-renováveis – como petróleo e solos – e, se forem irrigadas, a quantidade de água usada pode estar acima da taxa de renovação daquele recurso, em princípio renovável.
É fácil compreender que processos produtivos norteados pelo paradigma econômico neoliberal – que visam à produtividade máxima e cujos principais atores sociais são as grandes corporações transnacionais – são incompatíveis com a sustentabilidade, seja ela no plano ecológico, social ou ético. E, mesmo no que tange à dimensão econômica, são sustentáveis apenas por um tempo limitado. Isso acontece porque tais processos produtivos são respaldados por políticas públicas voltadas para o crescimento ilimitado, cujo alvo principal é a exportação; suas inovações técnicas visam sobretudo à competitividade; a noção de eficiência que lhes é inerente é pautada por parâmetros quantitativos; e se caracterizam pela produção de bens com pouco valor agregado (como a soja e o gado) e alto custo social e ambiental, ou seja, trata-se de um modelo de produção cujas externalidades não são consideradas.

Segundo Pindyck & Rubinfeld [4], “uma externalidade ocorre quando alguma atividade de produção ou de consumo possui um efeito direto sobre outras atividades de consumo ou de produção, que não se reflete diretamente nos preços de mercado. O termo ‘externalidade’ é empregado porque os efeitos mencionados (custos ou benefícios) são externos ao mercado”.

Economistas ecologicos
Martinez Alier [5] destaca que “a economia ambiental neoclássica parte do pressuposto que todas as externalidades (por exemplo, a poluição hídrica decorrente da suinocultura) podem receber uma valoração monetária convincente. Mas ele e outros economistas ecológicos – como Herman Daly e Georgescu Roegen, considerado o pai da economia ecológica – duvidam que seja possível avaliar monetariamente de forma convincente os efeitos irreversíveis e incertos de nossas ações de hoje sobre as gerações futuras. Os economistas ecológicos defendem a incomensurabilidade dos elementos da economia, mas aceitam, num plano prático, medidas que sirvam como instrumentos que levem a reduzir os impactos negativos da ‘economia sobre a ecologia’ (por exemplo, impostos sobre o uso de energias não renováveis)”. Os pressupostos da economia ecológica são, portanto, os únicos que podem dar conta das questões ambientais, exatamente por serem os únicos que questionam a racionalidade econômica em sua base. Isso é fundamental numa cultura cientificista, de base tecnológica como a nossa.
É interessante destacar, finalmente, que o conceito de externalidade evoca, entre outras questões, um sentido de não-pertencimento que desvela de forma emblemática a visão de mundo mecanicista e analítica que predomina na Economia, bem como nas demais áreas do conhecimento em nossa cultura.

Sustentabilidade, pautas de consumo e ética:
O termo sustentabilidade, apesar de muito polissêmico, engloba pelo menos três dimensões: social, econômica e ecológica (ou ambiental). Embora diversos autores (veja Ignacy Sachs, por exemplo) proponham outras dimensões – tais como geográfica, política ou cultural – a inclusão de uma dimensão ética é imprescindível, pois as propostas relativas ao chamado “desenvolvimento sustentável” – tanto teóricas, quanto de ordem prática – encontram-se imersas numa cultura cientificista. Como argumenta Herbert Marcuse [6], “a quantificação da natureza – sua tradução em estruturas matemáticas – separou a Ciência da Ética. A Ciência emerge, então, como ‘neutra´. E a concepção científica de uma natureza universalmente controlável (já que a matematização da natureza resultou em conhecimentos práticos válidos, ou seja, construiu uma realidade ´ideacional´ que podia ser efetivamente ´correlacionada´ com a realidade empírica) projetou a natureza como uma infindável ´matéria-em-função´, como mero substrato da teoria e da prática. Dessa forma, o mundo-objeto entrou na construção de um universo técnico – de um universo de instrumentalidades físicas e mentais – ou seja, de meios em si. Isso inviabilizou a possibilidade de vermos nossos ´objetos´ de estudo em termos de causas finais, isto é, como agentes éticos, estéticos ou políticos”. Portanto, “epistemologia é em si ética. E ética é epistemologia”, destaca Marcuse.
Essa é uma premissa de suma importância no que tange à compreensão da relação sociedade-natureza em nossa cultura industrial, pois abarca diversas outras discussões de cunho ético que estão no cerne do debate abolicionista animal, como a prática da vivissecção.
A relação entre sustentabilidade global, local e consumo ético deve ser discutida dentro de uma perspectiva sistêmica e muitas são as modalidades de consumo presentes no cotidiano da sociedade industrial que se prestam a tal debate: vestuário, transportes, habitação, uso de energia, etc. Neste artigo tratarei da dieta alimentar rica em proteína animal – dominante em nossa sociedade – pois ela é emblemática no sentido de apontar a conexão entre ecoeficiência e sustentabilidade e entre ética, política e saúde pública, entre diversas outras questões. Assistimos hoje a um declínio da capacidade de suporte de diversos ecossistemas – sejam eles terrestres ou aquáticos – e tal declínio deve-se, sobretudo, à forma pela qual tratamos a natureza. E isso inclui, é claro, os seres sencientes (humanos e não-humanos).
Impactos da dieta centrada em produtos de origem animal:
Desde cerca de 2003, aproximadamente um terço das espécies de peixes e frutos do mar [7] entrou em colapso. E, devido à queda no rendimento da pesca próxima ao litoral, houve um incremento na pesca comercial em águas mais profundas que já ameaça as espécies que ali vivem. Nesse ritmo, o voraz apetite humano por pescado e a poluição poderão afetar de forma irreversível a biodiversidade marinha e deixar milhares de espécies com pouco ou nenhum alimento [8]. Outros dados são igualmente impressionantes. Um deles é o fato de a agropecuária no Brasil responder por 69% do volume de água retirado dos mananciais. A pecuária sozinha demanda grandes quantidades de água para manutenção do rebanho, fase de abate, preparo agroindustrial dos cortes e oferta de derivados como leite e ovos [9]. E, segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), para se produzir 1 kg de carne são necessários cerca de 13.000 litros de água, enquanto para a produção de 1 kg de cereais entre 1.000 e 2.000 litros são suficientes. A criação de animais para consumo humano também faz uso de uma quantidade enorme de recursos alimentícios que poderiam ser destinados diretamente aos seres humanos. No mínimo metade dos cereais produzidos mundialmente vira comida de porcos, frangos, etc, assim como cerca de um terço das capturas pesqueiras [10]. E isso é termodinamicamente insustentável, pois são necessárias quantidades entre 3 kgs e 10 kgs de proteína vegetal para se obter 1 kg de proteína animal. A criação de animais em confinamento – como porcos e frangos – é responsável pela disseminação de resistência bacteriana (provocada pelo uso indiscriminado de antibióticos) e pelo esgotamento, poluição (eutrofização, por exemplo) e contaminação (por pesticidas de uso tópico, etc) de aqüíferos e outros recursos hídricos. Os rebanhos são também responsáveis pela degradação dos solos em larga escala, causando sua compactação e erosão, o que eventualmente acaba em processos de desertificação. Há ainda a emissão de gases do “Efeito Estufa” [11] e, como todos sabem, a expansão da fronteira agropecuária tem causado a destruição de ecossistemas ricos em biodiversidade, como a floresta amazônica e o Cerrado. De fato, um estudo recente da FAO deixou claro que a criação massiva de animais para consumo humano é o centro de quase todas as catástrofes ambientais: destruição de florestas, desertificação, escassez de água doce, poluição do ar e da água, chuva ácida e erosão do solo [12].
Máquinas de matar
O fato de os seres humanos consumirem carne e outros produtos de origem animal por prazer ou praticidade, não por necessidade, torna a dieta alimentar contendo tais ingredientes moralmente indefensável. Não nos damos conta disso por estarmos profundamente imersos em uma visão de mundo especista. Mas para que possamos saborear produtos de origem animal – como carne, ovos, leite e seus derivados – seres sencientes são aprisionados em compartimentos minúsculos durante toda a duração de suas vidas, sofrem diversas mutilações e danos psicológicos resultantes do tédio e da estressante condição de confinamento a que são submetidos e seu sofrimento só termina com a morte, sempre prematura. Segundo Negrão [13], “apenas no ano de 2006, 48 porcos foram mortos por minuto (de um rebanho de 25,5 milhões de animais) e 123 frangos foram mortos por segundo (rebanho de 3,9 bilhões de animais) para atender a demanda por carne. E isso somente no Brasil. Frangos vivem apenas 1,7% e porcos 3,8% de suas expectativas de vida”.
Além disso, magarefes e outros trabalhadores de matadouros adquirem distúrbios e doenças físicas e mentais – como lesões por esforço repetitivo – resultantes do “trabalho sujo” que fazem ininterruptamente – matar, sangrar, desmembrar – o que tampouco é algo natural. Quando éramos caçadores-coletores, cada grupo era encarregado de montar suas estratégias de caça, correr os eventuais riscos e despender as calorias a ela inerentes, ganhar ou perder uma “presa” e, inclusive, bancar moralmente a responsabilidade de tirar a vida de um ser senciente. Essa ainda é a fórmula básica para os povos caçadores-coletores que subsistem no planeta e que não têm outra alternativa: estão no universo da necessidade e não da liberdade, no que tange a esse tipo de decisão ética.
Cabe também destacar que, segundo a ONG Repórter Brasil, a atividade pecuária representa 62% da mão-de-obra escrava utilizada no país [14]. Noam Chomsky, no filme “A Corporação” [15], faz um comentário muito interessante acerca do caráter de pessoas, como executivos, que fazem parte das grandes corporações. Ele argumenta que – como também era o caso de senhores de escravos – os que participam de tais instituições podem ser, individualmente, pessoas com bons princípios morais, preocupadas com o meio ambiente, etc. Entretanto tais pessoas fazem parte de instituições (caso de muitas grandes corporações e da escravatura humana) monstruosas. O mesmo, eu diria, acontece no que diz respeito à escravidão que impomos aos animais não-humanos: trata-se de uma instituição monstruosa. Não reconhecer isso é firmar pé no confortável terreno da comodidade. E não nos iludamos. Também no caso da produção não-industrial – cujos efeitos nefastos seriam muito menores do que aqueles apontados antes, ou em alguns casos até inexistentes – tais práticas são moralmente condenáveis já que interrompemos as vidas dos animais ou os explorarmos por um motivo torpe: saborear sua carne ou seus derivados. Convido também aqueles que crêem que o chamado “abate humanitário” seja uma alternativa eticamente correta para que se informem melhor a respeito de tal prática.
Insustentabilidade (g)local ; ou seja, do local ao global e vice-versa
No Brasil, e em vários outros lugares do mundo, a expansão das monoculturas e da pecuária agrava os conflitos por terras, assim como a violência contra minorias étnicas, assassinatos de lideranças locais, etc. Esse modelo produtivo é também mais um vetor de pressão sobre o êxodo rural, cujas conseqüências são o aumento de “sem-terras” e desempregados que, muitas vezes, contribuem para intensificar o “inchaço” das periferias das grandes cidades. A cada ano centenas de milhares de pessoas são expropriadas de seu direito à terra e de seus tradicionais estilos de vida em todo o planeta para que commodities como a soja, ou a carne de gado, sejam produzidas em quantidades crescentes. Como se pode perceber, nesse modelo de produção unidimensional, não é possível separar em compartimentos estanques os aspectos ecológicos, éticos e sociais, entre outros, da sustentabilidade. Vejamos o caso da Amazônia. Entre 2001 e 2004 houve um aumento gigantesco na taxa de desmatamento provocado pela expansão do agronegócio e da pecuária. Entre 2003 e 2004, a Amazônia perdeu 27.200 km2 de florestas, sendo 48% em Mato Grosso, devido à expansão da soja. Em 2008, dados confirmam a tendência de aumento do desmatamento, alimentado pelo setor agropecuário [16]. Tal processo de destruição de diversidades – étnica, genética, cultural, etc [17] – é alimentado por grandes empresas [18] que controlam a maior parte do mercado de soja na Europa. Uma investigação da ONG Greenpeace mostrou como a soja amazônica – basicamente utilizada para alimentar animais – acaba nas prateleiras de supermercados e redes de fast food da Europa [19].
Mas nem é necessário ir tão longe. “Na Amazônia, 70 milhões de hectares já foram desmatados para a criação de pastagens, o que é mais do que a soma dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo juntos. E isso para gerar pífios 0,4% do PIB do país. Em quatro décadas, um terço das boiadas brasileiras foram transferidas para a Amazônia (no Brasil, ao todo, são 200 milhões de hectares destinados à pecuária). O Brasil é um pasto cercado de arame farpado por todos os lados e a Amazônia se tornou o grande curral do planeta às custas, em grande parte, do dinheiro suado do contribuinte: bancos oficiais como o BNDES e o Banco da Amazônia, são pródigos em ceder créditos vantajosos aos pecuaristas e frigoríficos (são mais de R$ 2 bilhões) e nosso governo apóia o IFC – International Finance Corporation (do Banco Mundial), quando empresta dinheiro (US$ 90 milhões) ao grupo Bertin para transformar a Amazônia em bife. Este grupo é tão sofisticado que, recentemente, foi multado por não conseguir sequer controlar seus efluentes das modernas instalações industriais do matadouro de Marabá, no Pará. A verdadeira causa da destruição da Amazônia é o forte crescimento do consumo de carne no último meio século. E de toda carne da Amazônia só 15% fica na região. O restante é enviado aos outros retiros do Brasil: São Paulo e o Sudeste devoram a Amazônia. De cada três bifinhos mastigados no Brasil, pelo menos um vem da Amazônia. Você já comeu a Amazônia hoje?” [20].
Mais expressões desse modelo autofágico
Além de todas as implicações destacadas antes, a dieta rica em itens de origem animal encontra-se fortemente associada às doenças que mais matam hoje no chamado mundo civilizado: câncer, problemas cardiovasculares, diabetes, etc [21]. Quanto mais as nações crescem economicamente, se urbanizam e se industrializam, maior é a sua demanda por proteína animal. E esse aumento no consumo de itens de origem animal – fato que está ocorrendo agora em países como o Brasil, a China e a Índia – é lamentavelmente visto como algo positivo, como uma medida do aumento da qualidade de vida das pessoas. No Brasil, por exemplo, o consumo de carne de frango aumentou 51% entre 1995 e 2005 [22]. Além disso, comemos cada vez mais gordura e açúcares refinados e menos fibras. A disseminação dessa dieta empobrecida, que conduz a um quadro específico de doenças e obesidade, é mais uma forma de expressão da “monocultura” que hoje domina o planeta. Essa dieta padronizada tem relação direta com modelos produtivos também “monoculturais” que primam pela produção em massa de grãos destinados à alimentação animal, como foi comentado antes, em detrimento da manutenção de uma biodiversidade possível, caso adotássemos políticas agrícolas baseadas nos chamados modelos de “jardins”, ou horticulturas, tradicionalmente empregados pelos povos autóctones da América do Sul, entre outros. No caso de países signatários da CDB (Convenção sobre Diversidade Biológica) e com uma legislação ambiental dita avançada, como é o caso do Brasil, a destruição de ambientes ricos em diversidade para dar lugar a monoculturas é ainda mais inexplicável, pois estamos ferindo preceitos de ordem tanto ética, quanto jurídica. De fato, quando adotamos tais políticas agrícolas não estamos cumprindo de forma responsável o acordo assinado. Por outro lado, os países que compram grãos produzidos nessas condições estão subsidiando a erosão genética tanto na base das cadeias tróficas – a diversidade das plantas – quanto no topo das cadeias, condenando à morte felinos, lobos-guarás e outros predadores que perdem seus territórios e suas presas [23]. Tais animais são muitas vezes recebidos à bala por fazendeiros por tentar obter a única fonte de alimento que lhes restou: o gado e os rebanhos criados para servir desnecessariamente de alimento aos humanos. Mas o que poderá uma mãe-puma ou mãe-loba ensinar ao seu filhote? Apenas caçar. Esta, porém, é uma prática cada vez mais difícil para eles, pois sua viabilidade depende de grandes territórios (em média 40 km2 por animal, podendo variar bastante).
Uma relação doentia com a natureza
Tenta-se remediar a atual perda de biodiversidade criando-se bancos para armazenar e conservar sementes das mais variadas procedências, como é o caso do chamado “banco de sementes do fim do mundo” [24], além de outros sistemas de gerenciamento de informações sobre a biodiversidade [25]. Tais bancos genéticos e sistemas de informação são vistos como iniciativas extremamente importantes. Mas a necessidade de tais práticas revela, na verdade, a relação doentia que temos com a natureza. De certa forma é como se achássemos normal viver drogados, mal alimentados e correndo riscos de todos os tipos, desde que houvesse uma ambulância permanentemente à nossa porta. Vale ressaltar, mais uma vez, a natureza eminentemente ética das questões que estão postas nesse debate, desde quando me refiro a animais marinhos ou seres humanos que ficam sem alimento, até a escolha de certas políticas públicas em detrimento de outras. A visão da natureza como uma grande fábrica – como uma mera fonte de recursos – já é de início uma questão de ordem ética. Ela revela o modo pelo qual nossa cultura expressa seus valores, seus saberes e isso torna urgente uma mudança de atitude rumo a honrar o título de “Sociedade do Conhecimento” ou “Sociedade da Informação” que nos outorgamos recentemente.
Precisamos de grandes revoluções em áreas como engenharia de alimentos, nutrição ou design, mas a maior das revoluções que precisa acontecer é em nossas mentes. Nossa ciência avança dentro do mesmo a priori tecnológico e responde de forma cada vez mais “eficiente” ao nosso antropocentrismo. Antes eram os jardins zoológicos e botânicos. Agora são os bancos de germoplasma e outros sistemas de conservação ex-situ, ou seja, em espaços cada vez menores são colocadas mais e mais formas reificadas de vida, genes de animais e plantas, a cuja existência plena negamos o direito. E a nossa cegueira parece não ter limites. De acordo com a FAO, a produção mundial de carne deverá mais do que dobrar até 2050 e atingir a marca de 465 milhões de toneladas, em contraste com as 229 milhões de toneladas relativas ao período entre 1999 e 2001. Já a produção de leite deverá subir de 580 para 1.043 milhões de toneladas [26].
Tais números são projeções e não creio que esse “banho de sangue” seja compatível com a capacidade de suporte da biosfera. Quem viver verá e, se tal catástrofe se concretizar, há de “chorar pelo leite derramado” [27]. Uma coisa é certa, porém. Será extremamente difícil explicar para as futuras gerações por que nossa sociedade com todo o conhecimento que já tem sobre nutrição, ecologia, medicina preventiva, sociologia, etc, permitiu que áreas tão grandes do planeta fossem devastadas – com todas as implicações apontadas antes – e seres sencientes fossem submetidos a um sofrimento sem precedentes históricos para que nossa geração pudesse saborear carne e sanduíches de frango em redes de fast food a preços populares. Seria para ficarmos doentes e consumirmos mais drogas testadas inútil e covardemente em animais? Seria para justificarmos gastos com projetos de conservação ex-situ (incluindo alguns museus etnográficos), de despoluição, de reflorestamento ou de créditos de carbono? Não creio que essas sejam escolhas conscientes por parte da maioria das pessoas. Elas são antes imposições resultantes de uma cadeia de eventos engrenados na teia de um véu através do qual tecemos nossa relação com o mundo.
Por uma nova ética: o veganismo como caminho
Destaquei até o momento, neste texto, os traços mais marcantes de nossa relação insustentável com a natureza. Gostaria de finalizar identificando algumas características de uma sociedade sustentável e elegendo o veganismo como um caminho privilegiado nesse sentido. O veganismo é uma proposta de conduta ética que prega a libertação dos animais não-humanos por meio da abolição de todas as formas de exploração que lhes são impostas pelos humanos [28]. Na dieta vegana estão excluídos todos os ingredientes de origem animal, como ovos, laticínios e mel (e qualquer tipo de carne, evidentemente), além de itens que contenham ingredientes de origem animal. A proposta vegana é uma postura ética com conseqüências benéficas importantes para os animais e para o planeta em geral e no que tange às questões abordadas neste artigo, fica clara a conexão entre a escolha de uma dieta vegan e as soluções para os problemas destacados.
A construção de uma sociedade sustentável depende ainda de exigirmos políticas públicas que tornem os pequenos e médios produtores os principais atores sociais. Os processos produtivos devem ainda ser guiados pelas premissas da economia ecológica; as políticas públicas devem ser voltadas para o atendimento das necessidades básicas e não direcionadas à exportação; os materiais e fontes de energia devem ser renováveis e visar a um grau pequeno ou nulo de poluição; a economia seria estável, compatível com culturas locais e outras espécies, sendo os limites e estímulos ao crescimento estabelecidos segundo critérios de ordem social, ética e ecológica; as pautas de consumo seriam generalizáveis à maioria; haveria uma maior ligação entre produtores e consumidores (com uma revitalização do campo e outros princípios da Agroecologia); e finalmente, mas não menos importante, teríamos que adotar sempre uma visão sistêmica sobre a sustentabilidade de qualquer processo produtivo – chamada por alguns de “cradle to grave”, ou seja, visão “do berço ao túmulo”, ou “do berço ao berço”, como alegam outros [29]. É interessante destacar que, no que tange a ciclos produtivos cujos produtos são seres vivos, não há como a cadeia ser do “berço ao berço”. E no caso dos produtos de origem animal, os “túmulos” desses seres sencientes são os estômagos dos humanos e de seus pets…
Precisamos, enfim, de uma nova arquitetura social que viabilize não somente a descentralização como condição sine qua non para a autogestão – uma necessidade importante de ordem prática – mas também de uma nova racionalidade que se contraponha à atual visão da natureza como um espólio a saquear, despida de valor intrínseco. E não serão as soluções circunscritas à ecologia rasa, essencialmente antropocêntrica, que nos ajudarão a frear o consumismo generalizado que esgota incessantemente as fontes de energia, acelera a entropia do planeta e trata seres sencientes e não-sencientes como mercadorias. O estímulo à adoção de uma dieta vegana, como política pública, poria um fim a todas as formas de exploração e sofrimento impostas aos animais não-humanos, ajudaria a restaurar a biodiversidade in-situ – em todos os níveis – diminuiria sobremaneira os impactos sobre os recursos escassos e propiciaria uma melhor qualidade de vida aos humanos evitando gastos milionários com procedimentos de intervenção. Mas sabemos que tal proposta vai de encontro aos interesses do grande capital em cuja trama os Estados encontram-se hoje reféns. Em sendo assim, cabe a pergunta: o que você está esperando para ser vegano?
Notas:
[1]: O especismo pode ser definido basicamente como qualquer forma de discriminação praticada pelos seres humanos contra outras espécies. Como o racismo, ou o sexismo, o especismo é uma forma de preconceito que se baseia em aparências externas, físicas, etc. A simples constatação de uma diferença é usada como um pretexto para a não aplicação do princípio ético da igualdade, entendida como igual consideração de interesses. Na ética utilitarista, ser passível de sofrimento é a característica que diferencia os seres que têm interesses – os quais deveríamos considerar – dos que não os têm. O principal interesse dos animais é o de não sofrer (física e psicologicamente). Veja Peter Singer, Tom Regan, Richard Ryder, entre outros.
[2]: DALY, Herman. “Boundless bull”. In: LAMAY, Craig L. & DENNIS, Everette E.(eds). Media and the environment. Washington, Island Press. 1991: 152-154. Veja também BRÜGGER, Paula, ABREU, Elise & CLIMACO, João V. Maquiagem verde: a estratégia das transnacionais versus a sustentabilidade real. In: GUIMARÃES, L.B.; BRÜGGER, P.; SOUZA, S.C & ARRUDA, V.L. (Orgs) Tecendo subjetividades em educação e meio ambiente. Florianópolis, NUP/CED/UFSC. 2003: 159-170; BRÜGGER, Paula. Educação ou adestramento ambiental? 3ªed. Chapecó: Argos; Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2004: 67-82.
[3]: Árvores centenárias, por exemplo, não deveriam ser consideradas renováveis.
[4]: PINDYCK, Robert S. & RUBINFELD, Daniel L. Microeconomia. 5ª ed. Trad.Eleutério Prado. São Paulo: Prentice Hall, 2002: 597.
[5]: Veja MARTINEZ ALIER, Joan. De la economia ecológica al ecologismo popular, 2ª ed. Barcelona, Icaria, 1994: 56-57.
[6]: MARCUSE, Herbert. A ideologia da sociedade industrial – o homem unidimensional. 6ª ed. Trad. Giasone Rebuá. Rio de Janeiro: Zahar, 1982: 153-162.
[7]: Alguns alegam que a expressão “frutos do mar” é incorreta – porque camarões ou mariscos não nascem em árvores – mas tal argumento não procede. A palavra “fruto” tem o significado geral de “produto” ou “resultado” de algo. Não se refere apenas a “produtos” de árvores ou outros tipos de plantas. Um contexto conhecido de todos é o emprego dessa palavra na oração Ave Maria, na qual há uma referência a Jesus como “fruto” do ventre de sua mãe, Maria.
[8]: Segundo um estudo da Organização Mundial para a Alimentação e a Agricultura (FAO/ONU) e do Banco Mundial é da ordem de US$ 2 trilhões (equivalentes ao produto bruto anual da Itália ou mais de 1,5 PIB anual brasileiro) o prejuízo provocado pela sobrepesca e pela aqüicultura no planeta, decorrente do esgotamento dos estoques pesqueiros e prejuízos para o meio ambiente e os recursos naturais. Mesmo assim se planeja dobrar a atual produção de pescado até 2015 e se estão licitando 5,5 milhões de hectares para projetos de aqüiculturas em terra e no mar, embora os cientistas venham reiteradamente alertando que 80% das espécies economicamente exploradas no País estão ameaçadas pela sobrepesca. A pesca tradicional nos oceanos chegou a um limite, com 50% dos estoques pesqueiros esgotados e 25% explorados além da capacidade de reposição. Para atender à demanda projetada para 2030 – acréscimo de 28,8 milhões de toneladas/ano, decorrentes principalmente do aumento da população mundial para mais de 8 bilhões de pessoas e do crescimento do consumo per capita (hoje em 16,7 quilos/ano por pessoa) -, as aqüiculturas teriam de se expandir muito. Mas o seu crescimento está declinando: foi de 11,8% na década 1985-1995, caiu para 7,1% na década seguinte e para 6,1% em 2004. Ainda assim, as aqüiculturas têm uma competição crescente com a avicultura e a pecuária pelo uso de farinha e óleo de pescado, usados na alimentação de peixes. Isso faz parte do quadro de insustentabilidade, em que para produzir um quilo de pescado pode ser necessário o consumo de pelo menos o dobro de insumos alimentares – sem falar nos danos para a biodiversidade aquática, na perda de mangues, no despejo de matéria orgânica, no uso excessivo de antibióticos (resumido de “As perdas não são apenas financeiras”, por Washington Novaes. http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/ 20081017/not_imp261452,0.php)
[9]: “Agropecuária é a atividade que mais consome água no Brasil, segundo relatório”; Agência Brasil/ site Ambiente Brasil (16/11/2006). Também segundo a FAO, a pecuária é um dos setores mais impactantes no que tange aos escassos recursos hídricos, pois contribui para a poluição e eutrofização aquática, bem como para a degeneração de recifes de coral. Estima-se que o gado seja a principal fonte terrestre de fósforo e nitrogênio responsáveis pela contaminação do Mar do Sul da China, causando a perda de biodiversidade naqueles ecossistemas marinhos (por Christopher Matthews; http://www.fao.org/newsroom/en/news/2006/1000448/).
[10]: Veja RIECHMANN, Jorge. Menos carne, mejor carne, vida para el campo – reflexiones sobre ecologia, ética y dieta. El Ecologista, (17), verão 1999: 30-34.
[11]: Somente em Santa Catarina o rebanho de 5,6 milhões de suínos produz 9,7 mil toneladas de gás carbônico (CO2) por dia, resultante do metano liberado pelas fezes dos animais (“Suínos geram 9,7 mil ton de CO2 por dia em Santa Catarina”; Agência Câmara/Ambiente Brasil – 30/03/2007).
[12]: Livestock’s Long Shadow -Environmental Issues and Options (FAO, 2006).
[13]: Negrão, Silvio L. Uma análise do ciclo de produção agroindustrial de suínos e aves no Estado de Santa Catarina à luz da perspectiva crítica da ética global. 2008. Tese (Doutorado Interdisciplinar em Ciências Humanas) – Universidade Federal de Santa Catarina.
[14]: Dados apresentados no 2º Ano do Pacto de Erradicação para o Trabalho Escravo (por Ricardo Viel; 20/05/07; ultimainstancia.uol.com.br/noticia/38073.shtml).
[15]: O documentário The Corporation (título original) foi escrito por Joel Bakan e dirigido por Mark Achbar e Jennifer Abbott. Veja http://www.thecorporation.org.
[16]: Fonte: estadao.com.br/Ambiente Brasil 04/04/2008 – “Desmatamento volta a crescer na Amazônia em época de chuva”. Ainda, de acordo com a FAO, o gado já ocupa hoje 30% da superfície total de terra do planeta e a abertura de novas pastagens é o principal fator de desmatamento, sobretudo na América Latina (por Christopher Matthews; http://www.fao.org/newsroom/en/news/2006/1000448/).
[17]: Sítios arqueológicos lá existentes correm o risco de ser destruídos por causa de atividades agrícolas, especialmente aquelas que levam à mecanização do solo, desmatamento, desenvolvimento de pecuária – que implica no pisoteio do sítio arqueológico pelo gado e normalmente também expõe os sítios ao uso do fogo na limpeza de pastagens- implantação de grandes obras de infra-estrutura, etc (Fonte: Filippo Cecilio/ Amazônia.org).
[18]: Segundo a ONG Greenpeace, tais empresas são sobretudo ADM (Archier Daniels Midland), Bunge e Cargill( http://www.greenpeace.org.br/amazonia/ comendoamz_sumexec.pdf)
[19]: Tais redes, também segundo o Greenpeace, são basicamente o McDonald’s e KFC (Kentucky Fried Chicken) que compra frangos da Sun Valley, empresa do grupo Cargill.
[20]: Resumido de Meirelles Filho, João. Amazônia: Carnaval ou Quaresma? Revista digital Envolverde, 13/10/2008.
Veja também “Sudeste consome carne originária de área desmatada”, por Herton Escobar (www.estadao.com.br/estadaodehoje/ 20081022/not_imp264079,0.php). Segundo a reportagem, a maior parte da carne produzida em áreas de desmatamento na Amazônia está sendo consumida no Sudeste, segundo um levantamento feito por pesquisadores do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Os números indicam que apenas 5% da carne produzida na região é exportada. E dos 95% que ficam no País, quase 70% são enviados para o Sudeste. O rebanho da região aumentou 180% entre 1990 e 2006, enquanto no Sudeste ocorreu o inverso: a área de pastagem diminuiu 15% e o rebanho encolheu 3% no período 1996-2006, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) compilados no Anuário da Pecuária Brasileira, do Instituto FNP.
[21]: Veja, por exemplo “Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases”. Relatório da OMS – Organização Mundial de Saúde (WHO – World Health Organization; Technical Report Series 916, Geneva, 2003.
[22]: http://www.mp.go.gov.br/portalweb/hp/4/docs/ trf3baurufiscalizacaoaguacarne.pdf
[23]: Segundo a FAO, 75% da diversidade genética de milhares de espécies de plantas desapareceu. Dos 7.000 tipos de plantas já cultivadas, só 150 espécies estão no cardápio hoje. Vale destacar também que “entre 10% e 30% das espécies de mamíferos, aves e anfíbios estão atualmente ameaçadas de desaparecer e antes que este século termine podem extinguir-se entre 25 e 50% das espécies terrestres. Essa é uma das conclusões a que chegaram os cientistas norte-americanos Harold Mooney e Peter Raven, considerados arquitetos da ciência da biodiversidade. Mooney advertiu ainda que a taxa de exploração dos recursos está se acelerando de tal forma que se pode chegar ao colapso de alguns deles, como, por exemplo, a água (“Cientistas alertam para perigo de extinção de 50% das espécies”- Fonte: Estadão Online/ site Ambiente Brasil – 18/06/2008).
[24]: Referência ao Svalbard Global Seed Vault, um banco internacional de sementes localizado no arquipélago norueguês de Svalbard, concebido para a chamada conservação ex-situ, ou seja, fora da natureza. Seu objetivo é conservar até 4,5 milhões de amostras de sementes e 2 bilhões de sementes de todas as espécies cultivadas. Hoje, 1.400 bancos de sementes no planeta armazenam cerca de 6,5 milhões de amostras. O Brasil tem o 7º maior banco genético vegetal do mundo, com 100 mil amostras de sementes.
[25]: Um grupo de cientistas de vários países propôs a criação do Sistema Global de Observação da Biodiversidade (Geobon). A idéia é constituir uma parceria internacional para auxiliar nos processos de coleta, análise, gerenciamento e divulgação de dados relacionados ao estado atual dos ecossistemas do planeta, com vistas a honrar o compromisso de reduzir as taxas de perda de biodiversidade até 2010, conforme assinado pelos 190 países que fazem parte da Convenção sobre Diversidade Biológica. A estimativa é que a manutenção do Geobon custe de R$ 500 milhões a R$ 1,2 bilhão por ano, incluindo os valores já gastos atualmente para o levantamento de dados sobre a biodiversidade pelos países que integrariam a rede (Agência Fapesp).
[26]: Importante destacar também que os animais criados para corte e para a produção de laticínios perfazem cerca de 20% de toda a biomassa animal terrestre (www.fao.org/newsroom/en/news/2006/1000448/).
[27]: A produção de leite é talvez a mais triste das indústrias, pois está ligada à produção de vitela que, como bem destaca Peter Singer, é a atividade rural intensiva mais repugnante do ponto de vista moral. “Quanto mais laticínios consumimos, mais leite as vacas precisam produzir e o setor de produção intensiva as trata como máquinas de produzir leite para seres humanos. Cerca de metade das vacas americanas vive em fazendas de produção intensiva. Passam toda a sua vida em alojamentos de concreto, ligadas a máquinas de ordenhar, as quais freqüentemente lhes dão choques elétricos. Mastite e infecções bacterianas, comuns em regimes intensivos, freqüentemente deixam resíduos de pus no leite que produzem. Devido à alta demanda por leite, as vacas de hoje produzem o dobro do leite que produziam há 30 anos e até 100 vezes mais do que produziriam no estado natural. As vacas da década de 1990 viviam apenas cerca de 5 anos, em contraste com 20 a 25 anos de vida, há 50 anos atrás. Elas são entupidas com drogas e químicos para prevenir doenças e aumentar sua produtividade, incluindo o famoso hormônio de crescimento bovino. Os bezerros que são obrigadas a parir regularmente para estimular a produção de leite são separados de suas mães em 24 horas, não tomarão seu leite e serão vendidos como bife. Em 60 dias as vacas serão engravidadas de novo” (Kingsnorth, apud Brügger, Paula. “Carne de vitela: um caso de crime hediondo”, artigo publicado no jornal A Notícia em 05/10/06).
[28]: No que tange ao vestuário, não se admite o uso de couro (ou qualquer outro tipo de pele), lã, ou seda e, no geral, quaisquer produtos/itens que tenham sido testados em animais ou que contenham ingredientes de origem animal (por exemplo, cosméticos, alimentos, produtos de limpeza, etc). O princípio abolicionista exclui também a compra de animais de estimação; o uso de animais para esportes ou diversão, a vivissecção, etc. Ser estritamente vegano é quase impossível, pois nossa sociedade usa derivados de animais nos mais diversos setores produtivos.
[29]: No relatório Livestock’s Long Shadow -Environmental Issues and Options, da FAO (2006), há um excelente exemplo de visão sistêmica sobre um processo produtivo. Segundo tal relatório “os estoques de animais vivos, mantidos para alimentação humana, têm mais responsabilidade pelas mudanças climáticas do que todos os veículos automotores do mundo somados: 18% da emissão de todos os gases causadores do aquecimento global são gerados pela indústria de carne. Essa conta inclui, além das emissões de metano provocadas pelo sistema digestivo dos animais, as emissões de CO2 geradas pelas queimadas que precedem a formação de pastos, a energia – quase sempre à base de queima de combustíveis fósseis – usada na fabricação de insumos agrícolas, a energia gasta na produção de ração e no bombeamento de água, a energia que vai nos procedimentos de abate e processamento das carcaças, o combustível usado no transporte de animais vivos e de produtos processados de carne, o combustível usados nos tratores e máquinas agrícolas, a energia usada nos navios pesqueiros para manter os estoques congelados por semanas a fio em alto mar, a energia para manutenção dos estoques refrigerados nos pontos de venda e, finalmente, a energia gasta nos lares para manter as carnes refrigeradas até o momento do consumo”. O relatório ressalta que no processamento de alimentos vegetais, os procedimentos que vão do plantio ao consumo são mais econômicos do ponto de vista da emissão de poluentes.

Paula Brügger é bióloga, professora do Depto. de Ecologia e Zoologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), ex-membro da Comissão de Ética no Uso de Animais – (CEUA), mestra em Educação e Doutora em Ciências Humanas – Sociedade e Meio Ambiente. É autora dos livros “Educação ou adestramento ambiental?”, que está na 3ª edição, e “Amigo Animal – reflexões interdisciplinares sobre educação e meio ambiente”. Atualmente coordena o projeto educacional “Amigo Animal”. E-mail: brugger@ccb.ufsc.br.

ARTIGOS E PESQUISAS
Por Terra Verde Viva
https://veganismoblogueiro.wordpress.com/2011/03/23/dieta-vegana-e-sustentabilidade-glocal/
23/03/2011
Dieta Vegana e Sustentabilidade (G)local
Por Paula Brügger (Terra Verde Viva)
brugger@ccb.ufsc.br


A DESTRUICAO ANUNCIADA-COMENTADA-REFERENCIADA

http://www.fao.org/docrep/010/a0701e/a0701e00.HTM
Livestock`s long shadow- environmental issues and options
FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS
Rome, 2006 

quinta-feira, 8 de junho de 2017

Plant Based Diet



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